26 de fev. de 2014

Um Ser de Luz X Redescobrir

Não gosto de fazer comparações entre artistas diferentes, principalmente quando se tratam de artistas que têm meu respeito.

Considero Maria Rita uma das melhores cantoras surgidas na música brasileira na última década. É filha de peixe, e como peixinha que é, é dona de uma voz praticamente perfeita.

Ainda não tinha escutado o Cd "Ser de Luz", em que Mariene de Castro homenageia Clara Nunes, cantando grande parte dos grandes sucessos de uma das maiores sambistas de todos os tempos.

E, ao ouvir esse disco, por mais que eu tenha achado o CD "Redescobrir", de Maria Rita em homenagem a peixona Elis Regina, sua mãe, impecável, ao ouvir o Cd de Mariene me foi IMPOSSÍVEL não fazer a comparação.

Maria Rita desde que surgiu chamou atenção pela óbvia, indisfarçável, indiscutível e incrível semelhança de timbre com Elis. Até aí eu não vejo nada de mal, uma vez que ela é filha da mulher, e, como ela mesma disse num desabafo, se vai ter alguém que parece com Elis é ela que é filha! Também achei que o disco em homenagem a Elis foi um carinho der filha para mãe, cantando de forma reverente o repertório insubstituível de Elis Regina.

Mas, apesar de musicalmente impecável, por conta da semelhança de timbre, o disco de Maria Rita, por melhor que seja (e é ótimo) me deu a sensação de estar ouvindo... um show de Elis. A voz é parecida, os arranjos também, e, talvez para não ser acusada (como sempre) de tentar superar a mãe, Maria Rita foi reverente a Elis nas interpretações.

Então vou ouvir o CD da Mariene, e me deparo com um disco tributo a Clara mas que soa absolutamente diferente de Clara. Os arranjos e a própria interpretação de Mariene, sem nunca tentar descaracterizar o repertório de Clara, tem vida própria. É um disco de Mariene cantando Clara, ao passo que o disco de Maria Rita é um disco de Elis por Maria Rita.

Enfim: adorei o disco de Mariene, e cada vez mais teorizo que ela é a terceira ponta de um triângulo de grandes sambistas atuais, a ponta que está na Bahia (as outras são Teresa Cristina no Rio e Fabiana Cozza em Sampa). Mariene, minha ex-colega de escola, arrasou! Matou a pau!

25 de fev. de 2014

De Normal Bastam Os Outros - Maria Alcina


Maria Alcina sempre foi uma artista fora do comum em todos os aspectos. A começar pelo timbre de sua voz, extremamente grave, masculino, cru, quase duro, mas ao mesmo tempo capaz de sutilezas de interpretação e intenções. Sua imagem fora do convencional, misturando símbolos de extrema feminilidade como plumas, brilhos, maquiagens, mas capaz de ostentar durante uma fase de sua carreira uma reluzente cabeça raspada!

Maria Alcina apareceu na MPB quando quando defendeu e ganhou o VII Festival Internacional da Canção com "Fio Maravilha", em 1972. Na sua voz essa música se tornou um imenso sucesso nacional e uma das músicas mais famosas de Jorge Ben. De lá para cá, com altos e baixos independentes de sua vontade, Alcina nunca foi esquecida.

Apesar de sua música ter caráter claramente apolítico (pelo menos no sentido de militância), sua figura andrógina motivou uma perseguição e censura pelo governo militar. Era irreverência e histrionismo demais para os generais duros dentro de uniformes engomados dos anos 70.

Pois a cantora cheia de "calor na bacurinha" está de volta, mais fogosa do que nunca, e interessante como sempre.

Produzido por Thiago Marques Luiz, "De Normal bastam Os Outros" poderia se escorar apenas em músicas já conhecidas (como Bigorrilho ou Segura esse samba, Ogunhê), mas entre os melhores momentos estão as novas músicas compostas especialmente para o disco, como "Cocadinha de sal" (Karina Buhr) e, acima de todas, a auto referente "Eu sou Alcina", em que Zeca Baleiro acerta em cheio ao descrever a personalidade cativante da cantora.

Outro momento delicioso do CD é a música de Arnaldo Antunes que dá título ao disco. A música seria ótima por si só, mas o ápice é quando Alcina termina com um belíssimo e catártico palavrão e pedindo aos técnicos que o coloque no meio da música, vontade obviamente atendida, graças a Deus, para a delícia de quem escuta o CD.

"De Normal bastam Os Outros" é uma festa, e ainda bem que ainda existem em atividade alguns cantores sem medo da ousadia e do risco da estranheza. É um disco para comprar e ouvir sem parar!


1. Eu sou Alcina (Zeca Baleiro)
2. De normal bastam os outros (Arnaldo Antunes)
3. Sem vergonha (Jorge Ben Jor)
4. Nhém nhém nhém (Totonho)
5. Segura esse samba, Ogunhê (Osvaldo Nunes)
    Dondoca (Adoniran Barbosa / Hervê Cordovil)
6. Não se avexe, não (Haydée de Paula / Chico Anysio)
7. Bigorrilho (Paquito / Sebastião Gomes / Romeu Gentil) - com Ney Matogrosso
8. O Chefão (João Bosco / Aldir Blanc)
9. Cocadinha de sal (Karina Buhr)
10. Fogo da morena (Felipe Cordeiro)
11. Concurso de bichos (Anastácia / Liane)
12. Dionísio, Deus do vinho e do prazer (Péricles Cavalcanti)