9 de dez. de 2011
O Recanto de Gal Costa.
Gal Costa está de volta, depois de uma lacuna de 6 anos sem gravar (5, se formos contar os CDs "Gal Costa Live at Blue Note" e "Gal Costa Ao Vivo", de 2006). O último disco de estúdio de Gal foi "Hoje", lançado em 2005, no qual a cantora apresentava ao grande público compositores pouco conhecidos, uma coleção de boas canções, mas que, por motivos mais que sabidos - ou mesmo impossíveis de definir - não fizeram sucesso e ainda que o disco tenha recebido boas críticas na época de seu lançamento, permanece pouco conhecido do grande público. O fato é que somente os fãs mais dedicados - e Gal Costa os tem aos montes - conheceram o CD.
Acaba de ser lançado pela gravadora Universal o CD "Recanto". No disco, Gal interpreta 11 canções de Caetano Veloso, que também produziu o CD. Bom... dizer que Caetano produziu o CD e compôs as músicas é uma meia evrdade. O fato é que "Recanto" nasceu de uma idéia de Caetano, que propôs à cantora gravar um CD produzido por ele, somente com canções dele e com sonoridade imaginada por ele, centrada em programações eletrônicas. Dada a proximidade entre os dois artistas, é mais que claro que Gal topou o projeto.
Depois de anos com uma incômoda sensação de que minha adorada cantora preferida iria se tornar uma espécie de súper-Emílio Santiago, relendo com competência mas sem grandes inventividades clássicos ultra conhecidos, Gal gravou um dos CDs mais instigantes e profundos de sua carreira.
Nunca, em nenhum de seus discos anteriores, nem mesmo os mais badalados pela crítica ou os maiores sucessos de público, Gal Costa esteve tão desnudada. Não acho que o fato de ter a maior parte dos arranjos pautados em programações eletrônicas faça de "Recanto" um CD 'moderno.' Ora, a eletrônica não é nenhuma novidade no cenário da MPB, a anos tem figurado em discos de vários artistas do Brasil, como Adriana Calcanhotto, Fernanda Porto, Vanessa da Mata (que estourou nacionalmente com um remix de sua canção "Ai ai ai ai"), só para ficar nas cantoras, foco desse blog. Até a própria Gal Costa já flertou com a eletrônica em seu CD "Aquele Frevo Axé", de 1998, produzido por Celso Fonseca, além de já ter tido algumas de suas músicas remixadas, como já aconteceu com suas gravações de "Socorro", "Chora tua tristeza" e "Sebastiana". Ou seja, a voz de Gal e a aletrônica não são totalmente estranhas uma à outra. O que faz com que "Recanto" seja um CD altamente instigante são as canções compostas por Caetano (9 inéditas, duas já pré-existentes) para Gal cantar. Caetano tem contado nas entrevistas de lançamento do CD que teve a confirmação de suas intençôes de produzir esse disco com Gal ao vê-la em um show de voz e violão em Portugal, de onde tirou a imagem dos versos "roço a minha voz no meu cabelo", da letra de "Autotune autoerótico", uma das canções novas. Caetano criou canções de letras longas e melodias repetitivas, que adornadas com os arranjos eletrônicos soam como o oposto total do que se espera de uma cantora como Gal Costa, conhecida por seu apego à melodias mais rebuscadas e... melodiosas. Mas aí é que está o pulo do gato: se Caetano foi radical na composição das melodias, às vezes dura e lineares, efeito acentuado pelos arranjos, que poderiam ser estranhas à voz de Gal, ele criou letras que são, a todo momento, referências, explícitas ou não, à obra, vida e personalidade de Gal. Algumas pessoas têm insinuado pelos "recantos escuros" da internet uma possível passividade da cantora na produção desse disco, mas, incrivelmente, num disco totalmente idealizado por Caetano Veloso, Gal Costa NUNCA FOI TÃO ELA MESMA, e através das letras de Caetano Gal tem a ousadia até mesmo de tocar em assuntos delicados, como a postura de diva ostentada em certa fase da carreira ("era só fazer pose e cantar / presa ao dinheiro"), as cobranças sempre feitas a ela de realizar discos e shows "modernos", "revolucionários" ou "inventivos" ("Convidam-me a mudar o mundo / É fácil: nem tem que pensar / Nem ver o fundo"), dureza de viver ("Viver é um desastre que sucede a alguns"), a maternidade recente ("o menino salva as madrugadas") e mais um outro tanto de frases/flashes que falam muito sobre Gal, de uma forma como nunca antes, nem em "Vapor barato", "Baby", "Festa do interior" ou mesmo "Meu nome é Gal" aconteceu.
"Recanto" é um súper disco por aliar ótimas canções, arranjos que tentam a todo momento fugir dos sons convencionais e confortáveis, e uma cantora que canta com grande verdade. "Recanto" é, na minha opinião, depois do ousadíssimo "Gal", de 1969, o disco mais inusitado de Gal Costa. Muita gente vai estranhar, mas o disco já é um sucesso de crítica, apesar de uma (e não sei se outra) opinião negativa. Porém, como diz o verso final de "Recanto escuro": "Coisas sagradas permanecem / Nem o Demo as pode abalar / Espírito é o que enfim resulta / De corpo, alma, feitos: cantar"
O REPERTÓRIO
1- Recanto Escuro
2- Cara do mundo
3- Autotune autierótico
4- Tudo dói
5- Neguinho
6- O menino
7- Madre Deus
8- Mansidão
9- Sexo e dinheiro
10- Miami maculelê
11- Segunda
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Valeu, Doug! Muito bom!
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirConfesso que no início me causou uma grande estranheza, não me identifiquei de cara com a sonoridade do disco. Creio que isso aconteceu justamente porque estava preso às referências dos trabalhos anteriores, mas depois consegui entrar em comunhão com a poética do disco.
ResponderExcluirEsse álbum é realmente de ruptura com essa imagem de diva sacralizada e cultuada que pesa sobre a humanidade de uma cantora tão notável. Ele é bem seco musicalmente, não é melodioso, nem tem arranjos com harmonias robustas. Experimental, ousado, poético e metalinguístico.Tem um clima bem sombrio, melancólico, áspero, desconcertante. A beleza dele parece se concentrar justamente nesses elementos. "Recanto" é um álbum que diz pra que veio já no título. A metalinguagem presente nas canções do Caetano expressam bem a relação da intérprete com a própria voz, com o canto possível hoje aos 66 anos de idade,
e reflete sobre as expectativas que se criou (e ainda se cria) em torno do seu instrumento de trabalho baseado na fixação do público e da crítica numa Gal divinizada por seu passado glorioso, porém, passado. Temos hoje o canto de Gal mais grave, escuro, sombrio, dessacralizado, e ainda assim, belo.
Pessoal,esperei feito um condenado pelo novo trabalho da Gal o "Recanto",mas ao ouvir-lo,cheguei a triste constatação: O album é muito ruim,as músicas são todas insossas,sabe? Não tem uma que se diga: Nossa essa vou ouvir outra vez. Na minha opinião, é claro! Enfim... O Recanto,deveria se chamar o Desencanto. Agora,lógico que a culpa pelo fracasso,não é da Gal e sim do Caetano,pois todas as letras são dele. Ainda tem gente que acredita que ele é um Deus.
ResponderExcluirO pior é que nas comunidades de Gal,há alguns fãs que amaram o novo trabalho,dá para acreditar,nisso? Ora,senhores,eu tambem sou fã da Gal,não ainda não perdi minha lúcidez,fazendo favor,né? Enfim...
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluir